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// On :quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Ave Butler! Hail Mott!


Os partidos, agremiações e instituições da esquerda brasileira (ao menos aqueles que se importam com as chamadas opressões específicas) estão perdendo a guerra contra o machismo. Temos reparado, de uma forma muito freqüente, a toda uma série de maus-exemplos, vindos de nossa juventude e de nossas lideranças.
A ANEL, a CSP e especialmente o MML têm desgraçadamente falhado no embate as opressões de gênero por falta de conhecimento e bases teóricas sólidas. Uma primeira critica se pode fazer à insistência destas instituições em defender um modelo teórico centrado no recorte de classe (a chamada 2ª onda feminista) em detrimento de todo um debate sobre a opressão de gênero em si. Não é viável pensar na diferenciação do sexismo vivenciado pela mulher burguesa, a proletária, a negra, a estudante, se não há uma explicação aprofundada para o origem da homofobia, do cissexismo e do machismo. Por exemplo, a ANEL apresentou por ocasião do I Encontro de Mulheres da UFRJ, uma contribuição que meramente ignora debates acadêmicos que têm viabilizado lutas e ações diretas em todo mundo- ao exemplo da Marcha das Vadias, Bash Back, queer theory, pós-pornô, anti-sexo- acusando estes movimentos de serem ‘pós-modernos’ e burgueses, subestimando a força política por trás de tais fenômenos sociais.
Das diversas opressões específicas, o machismo é a mais importante, pois atinge intimamente todas as pessoas, indiferente de raça, religião, classe social, idade e gênero. E é central o seu embate por que engendra, constrói e organiza todo um sistema de poder. O machão sofre por ser obrigado a endurecer seu discurso desde que nasce. As mulheres, crianças e idosos sofrem com as agressões de seus companheiros e parentes, que aprenderam desde sempre a se fazer respeitar pela força bruta. E os homens mais politizados e que não se enquadram nesta lógica perversa sofrem com uma violenta desqualificação social- tendem a ser considerados pela sociedade como "menos homens".
Infelizmente, sanções do tipo simbólico, como fazer o machão pedir desculpas formais, ou retirar os agressores da organização das mesas, como vimos na greve estudantil da UFRJ, por exemplo, na prática surtem efeito contrário ao esperado. O tiro sai pela culatra por que aquilo que se espera ser uma ação educativa se torna um mau-exemplo, uma vez que tais penas são suficientemente leves ao ponto de serem percebidas não como sanções, mas como conivência institucionalizada à opressão. Apenas para dar um exemplo das distorções, em nosso grupo de discussão política, recentemente definimos que atrasos às reuniões seriam punidos com a perda momentânea do direito de fala. Qual o peso didático de se punir meros atrasos com rigor muito maior que um caso de agressão machista/sexista? Não seria deseducativo, uma vez que passaria aos demais companheiros, especialmente aos mais jovens (portanto, com a mente e noções éticas em formação) e menos informados- ou seja, aqueles que mais necessitariam ser sensibilizados- a idéia de que “não dá nada ser machista”? E pior, além de reincidir no erro, o indivíduo ainda ganha status no interior dos mecanismos e aparelhos, ao demonstrar uma sensibilidade ao tema,muitas vezes falsa.
Acredito que a questão seja muito mais complexa e perversa. Uma das correntes ignoradas pelos companheiros é a dos novíssimos estudos masculinistas. Parece-me que a academia e os intelectuais têm percebido cada vez mais a importância de colocar na mesa também o debate sobre as masculinidades e sobre a opressão do homem. O homem deixa de ser visto como a origem do machismo e passa a ser encarado com um vetor do sexismo, tão oprimido quanto a mulher. Foulcaut nos ensina que as relações de poder, portanto as opressões em geral, não são sempre hierárquicas, assim sendo a mulher nem sempre cumprirá o papel da oprimida, cabendo este papel ao homem. Um exemplo bem simples e que se pode ver a partir de um recorte de classe, é o da alta executiva de uma empresa multinacional (as mulheres estão cada vez mais presentes nas grandes empresas, apesar e por ganhar em média 30% a menos) que discrimina o porteiro do seu edifício e pela noite procura garotos de programa (os homens também estão cada vez mais presentes no opressivo mercado da prostituição).
Numa conversa acalorada com uma colega, expliquei-lhe que valorizar um rapaz pelo tamanho da barba era tão absurdo quanto julgar uma moça pelo tamanho dos glúteos. A barba, conforme podemos observar numa análise da história da moda e dos costumes, fora considerada como indecente e símbolo de desleixo, apenas a partir de meados do século XX e em espaços públicos e privados conservadores, como igrejas e prestadoras de serviços formais. A barba sempre foi tida como um forte símbolo de maturidade viril ao ponto de se acusar de “imberbe”, portanto dignos de descrédito, aos rapazes mais jovens e inexperientes. A idéia, ao contrário do que muito se imagina, é que a barba por fazer, os músculos avantajados, a voz grossa e intimidadora, a competitividade, a disposição instintiva para apelar a violência (mesmo física), a desvalorização da figura feminina, são caracteres desejáveis aos líderes e que devem ser imitados pelos mais jovens. Basta uma olhadela à nossa volta para repararmos quantos em nossa liderança se enquadram no perfil do troglodita sexista.
Muito se critica e se questiona- e com toda razão- o conteúdo e mensagens machistas dos comerciais de cerveja, por exemplo. Mas proponho que se observe também qual a imagem do homem ideal, apresentado nas mesmas campanhas publicitárias. Com excessão do baixinho da Kaiser, que apesar de ser feio (“feio” sob que critérios?) aparecia em meio às beldades dos vídeos (alusão subliminar ao poder econômico como substituição a sedução baseada na aparência física?), a maioria é branca, fala grosso e quase nenhum apresenta a famosa “barriga de chopp”.

“Mulher não é só bunda e peito”. “Homem não é só músculos, barriga tanquinho e status social”.

E assim, chego ao ponto mais polêmico do meu discurso, tais caracteres e símbolos da supralternidade masculina não são apenas desejáveis, como são fetichizados (sexualmente valorizados) em nosso meio, assim como na cultura burguesa em geral. Aprendemos com Freud a importância da sexualidade na formação psicológica e observamos a importância política central do sexo na sociedade contemporânea.  Como diria Foulcault, “sexo é poder”, assim, também é espaço de opressão e também estratégico campo de batalha, na luta contra o sexismo patriarcal.
Há explicações das mais diversas para tal fetiche da masculinidade opressora, desde aquela biologizante, que liga os símbolos de força viril e a conformação dos seios e quadris femininos a capacidade maior de reprodução, até a que o explica através da cultura. Mas indiferente de qual e explicação apresentada, as instituições que defendem o combate as opressões têm feito vista-grossa a estes e outros construtos sócio-culturais do patriarcado. Estamos tão habituados a conviver com tais discursos que tendemos a naturalizá-los ou ignorá-los, quando não os aplaudimos.
É sexy ser machista? O machismo é um mero pecadilho ou um modelo de pensamento que induz a sérias agressões e vitimiza a toda sociedade?
Me dirá uma companheira feminista que cabe à mulher “ensinar” seu companheiro e admoestá-lo a deixar de ser machista. Indago que força cultural levaria uma mulher a escolher como companheiro e dividir o mesmo teto com um homem que sabidamente a irá desrespeitar, e apresento como explicação a defesa despercebida de um postulado básico do patriarcado: enquanto em nossa sociedade o homem é preparado desde a infância para ser o líder, o provedor, à mulher cabe o papel da cuidadora e da curadora. Justamente por isso, naturalizamos a idéia de que a mulher deve “curar” seu companheiro do seu “vicio”. Tal atitude feminina, quando posta em prática, é socialmente perversa, pois desvaloriza e pune com restrições o homem que não se enquadra em tal, ao passo que coroa o machista, dando ao opressor como prêmio, seus maiores tesouros: seu corpo, seu tempo, seus carinhos, seus cuidados, seus sonhos...
Aliás, a idéia de que “se o corpo é da mulher, ela dá pra quem quiser” se ancora noutro postulado patriarcal, a de que o corpo feminino é uma oferenda a ser imolada em nome do macho por ela escolhido, que via-de-regra será, a partir de uma complexa engenharia do fetiche e do desejo (adivinhem...)aquele que se enquadra no perfil do macho-alfa-opressor-burguês. Enquanto houver capitalismo, o discurso do consentimento não passará de mera ilusão e de uma estratégia perversa e excludente de segregação das minorias e de conservação do status-quo- uma vez que é o próprio sistema que define o que é ou não “desejável”. E extremamente violento, pois usa como ferramenta de repressão alguns dos instintos mais importantes para a sobrevivência e sanidade humana.
Sanções simbólicas são deseducativas e perdem o caráter exemplar. Machistas, racistas e homofóbicos devem ser tratados com rigor. É preciso para que tenham algum efeito, que casos de machismo, racismo e homofobia sejam severamente reprimidos para que os agressores não reincidam em tais atitudes. A luta contra as opressões só avançará e terá êxito, quando os agressores deixarem de ser constrangidos e começarem a ser PREJUDICADOS, devido as próprias ações covardes e autoritárias. Indiferente do cargo e posição deste dentro das instituições. Penalidades igualitárias e democráticas! Doa a quem doer- e que doa (muito) nos próprios agressores.
Por outro lado, e eis o paradoxo, aprendemos pela experiência histórica que não se pode levantar guilhotinas em praça publica, pois arriscaremos culpabilizar e perseguir pessoas inocentes. Como diferenciar o machista reincidente e sádico daquele que desconhece e portanto não reconhece os efeitos das próprias ações? Aliás, como reconhecer o limite entre uma brincadeira aceitável e um atentado, se as esferas de poder naturalizam e fetichizam tais atitudes?
Sim, somos todxs machistas! E para vencermos este estágio do capitalismo, precisamos urgentemente criar uma educação radicalmente não-sexista, que contrarie as normas de gênero e ponha em cheque as diferenciações naturais entre meninos e meninas. Precisamos construir uma cultura que desconstrua todas as formas de fetiche e precisamos debater e indagar sobre quem afinal comanda nossos desejos. É preciso, antes de ensinar os homens a não serem sexistas, educar as mulheres machistas (grande parte delas encasteladas no interior do feminismo) para que não valorizem e incentivem seus machos virulentos. E, antes de tudo, temos que admitir nosso tabu, conservadorismo e hipocrisia ao lidar com os temas das sexualidades, desejos e opressões de gênero.

ADENDOS: 
1)Quem está mais familiarizados com os debates sobre opressões de gênero (e de gênero em geral) deve ter percebido que a minha critica fora reduzida propositadamente ás relações heteronormativas e cissexistas. Precisariamos de um espaço infinitamente maior para nos aprofundarmos e discurtrimos outros tipo de relação de poder/opressão. O problema é muito mais complexo do que parece... 
2)Estou muito revoltadx com atitudes de certas lideranças acusadas de serem "machistas" por terem sido pegas "chifrando" seus/suas companheirxs. Isto não é "machismo", é TRAIÇÂO da mais nojenta. E quem trai seus companheiros e não honra seus compromissos, mais tarde, se eleito, desonrará seus eleitores e trairá a classe trabalhadora. Tenho dito :(

No closet

Desbundai e putiái!

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