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// On :terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Ave Butler! Hail Derrida!

"Na sua opinião quem vai ganhar as melhores notas? Quem vai ser execrado? O machão heteronormativo agressivo? O cara imberbe com cara de adolescente? A bichinha andrógina bissexual? O negro? O branco? Quem merece ficar na casa? Quem vai ficar até o final? Você escolhe. Você julga, Você dá as notas. Bem vindxs ao BBB da vida real!"

Olá, resolvi desfazer meu silêncio depois de tanto tempo para falar da polêmica do momento: a criação de dois aplicativos IDÊNTICOS que permitem aos usuários dar "notas" as performances sexuais de pessoas do "sexo oposto" e estão sendo corretamente acusados de promover opressão de gênero, expondo pessoas, sendo "machistas" e aquele "mimimi politicamente correto"(leia-se debate limitado e dogmático de sempre). Resolvi lançar este texto que já estava construindo à dias, mesmo depois de saber que o Tubby não passava de uma "trollagem", pegadinha interessantíssima feita justamente para demonstrar o sexismo dentro de certos discursos que se dizem feministas. E percebi que deveria só agora publicá-lo, justamente por ir na contramão dos discursos hegemônicos sobre o tema.

Bem, antes de continuar e que me xinguem, vou colocar minha posição política sobre os tais programas: são jogos sexuais e portanto violêntas ferramentas de controle social que não foram inventadas agora, pelo contrário existem desde o primórdio da Humanidade, em forma de "sussurros laterais", no interior dos claustros, saunas, conversas entre matronas, bar das amigas, enfim, qualquer espaço de interação social. O que me deixou bastante triste foram argumentos por parte de feministas mais tradicionais, ao meu ver bem falaciosos, e que buscam vitimizar as (cis)mulheres em detrimento dos (cis)homens- reafirmando e reproduzindo sem perceber uma lógica sexista, dicotômica e essencialista.

Argumento desnecessário, pois o simples fato de alguém ter sua vida sexual e afetiva devassada, destruida por essa brincadeira macabra e vir a cometer suicido transforma em assassinos, genocidas quaisquer pessoas que insistam em compactuar com isto. Seria totalmente a favor do fechamento desses aplicativos caso o problema fosse apenas virtual. Pelo contrário, Lulus e Tubbys fazem e sempre fizeram parte de nosso cotidiano, não trazem absolutamente nada de novo, apenas tornaram esta brincadeira sinistra (e que convenhamos, todo mundo faz uma vez ou outra) algo muito maior, mais ágil, ao alcance de nossos dedos e em total anonimato.É a democratização do espírito de porco.

Um brinde à hipocrisia.

Um dos argumentos usados por algumas feministas que mais me chamou a atenção foi a de que o Lulu seria uma resposta ao machismo, por que os homens sempre tiveram o direito de fazer este tipo de brincadeira "pênis-ciosa" com as pobres mulheres oprimidas. Isso é mito, provavelmente isso tudo começou logo que o ser humano inventou a técnica de se comunicar oralmente.

Para a pesquisadora da educação Helena Altmann , os jogos infantis no ambiente escolar se dividem  em masculinos e femininos, sendo que os jogos dos meninos se baseiam na violência, na força fisica, na esperteza, enquanto os das meninas são baseadas na comunização (em especial dos desejos), na sociabilização,nos sentimentos,no "namorico". Ao contrário do que chiam tanto xs feministas segundo-ondistas de plantão, as meninas são tradicionalmente introduzidas aos jogos eróticos mais cedo que os rapazes- embora sempre "ás escondidas".Em nossa sociedade, mulheres brincam de Lulu desde a pré-escola, enquanto os homens estão ainda mal e porcamente aprendendo a chutar bola. A quem discordar, sugiro uma  visita à escola mais próxima como experiência.

Mas não se trata aqui de dar corda a Guerra dos Sexos, de apontar infantilmente quem começou, como tenho lido em vários sites, mas de demonstrar o que ambos os aplicativos têm em comum: TUDO- são absolutamente idênticos(!). Idênticos em sua proposta, idênticos em sua forma, idênticos na grosseria, identicos como ferramenta de controle social...

Algumas pessoas têm comentado que um dos programas, o para homens, é mais "machista" e "misógino". Isso é uma ilusão. Quem diz que hashtags como "#nerd" e "#peganinguem" são menos ofensivas que "#AnalVoluntario" e "#vadiagulosa" (são só exemplos, não participo desses aplicativos) é porque desconhece a forma como a educação sexual impõe padrões de performance diferentes entre os sexos, desconhece como a quebra destes padrões tem sido trágica e levado inclusive a mortes e agressões intensas de "ambos os lados" . Se esquece, por exemplo, que na nossa sociedade a expressão "vagabundO" tem um conotação bem diferente que "vagabundA".

Dizer que uma garota "dá pra todo mundo" é o mesmo que dizer que o cara "não come ninguém", justamente por que a sociedade incute nas nossas mentes idéias antagônicas sobre a sexualidade e que são reforçadas através da linguagem. As hashtags da versão feminina não são menos apelativas, apenas parecem mais sutis. Até porque a avaliação das pessoas pelos tais serviços não se dá apenas pelas hashtags, mas por uma nota, de "0.0 á 10.0", que definiria a performance da vitima. Numa sociedade tão materialista e cartesiana como a nossa, números exprimem muito mais que palavras. Não vale botar um "#pracasar" com um "2.0", ou um "#barangona" com "10.0" pra disfarsar o golpe baixo.

 Além disto, o ato de tentar definir pelo outro a opressão que o outro sofre, é uma atitude colonizadora, de um autoritarismo absurdo. É óbvio que a linguagem dos aplicativos é diferenciada, pois os seus públicos também são diferentes.  De fato, o macho-alfa é incentivado desde cedo a ser o "comedor", o "garanhão", enquanto a mulher ideal é treinada desde criança para seduzir e usar seu corpo como arma desde que o faça de forma recatada, pois o prazer feminino é permitido desde que dentro do limite do "papai não pode saber-embora ele saiba".

É por isso que a exposição publica sexual de adolescentes do sexo feminino é execrada enquanto a dos machinhos é comemorada. A culpa é sim, dos irresponsáveis que as publica, mas antes de tudo, da sociedade que categoriza os gêneros, cria padrões de conduta diferenciados, aquilo que pode ou não ser feito, pode ou não ser dito.  É por isso que "cantadas" em locais publicos  são vistas como assédio pelas mulheres e prova de status sexual pelos homens (acredite, muitos homens e mulheres adoram "pedreragem", mas não admitem). E é por isso que não se fala no tabu do estupro masculino- pois se um homem adulto der queixa na delegacia, no minino será motivo de gozação, vão perguntar se pelo menos a agressora era "gostosa". Em suma, o problema não é do "machismo", conceito-estanque desenvolvido e repetido ad nausean por aqueles que não querem se aprofundar no debate do tabu "anti-classista e pós-moderno" das relações de gênero e poder. O problema tem outro nome que precisa ser gritado e ser ouvido: "REPRESSÃO SEXUAL"- em especial dos seres biosocioculturamente assinalados como "mulheres".

Algumas feministas meramente "acusaram" o Tubby de ser hipersexualizado. Uè, então ao invés das mulheres militarem pela liberação sexual,  para termos uma vida sexualmente ativa e feliz igual a dos homens (mais um mito sexista, a maioria dos homens sonham ter a vida sexual que grande parte das feministas pensam que eles têm) vamos criminalizar o sexo?!? A idéia é retroceder de propósito?!? Por que o sexo tem que ser algo tão sujo e imoral(izante)? Será que o problema não seria pelo contrário, uma pseudo-hiposexualização feminina? Porque em pleno século XXI o sexo continua sendo o Bicho de Sete Cabeças da sociedade ocidental?

"Sex is not the Enemy"!


E diferentemente do que têm vociferado certas vozes feministas, nessa Guerra dos Aplicativos, não há nenhuma "falsa-igualdade". Pelo contrário, há uma reprodução virulenta de uma falsa-dicotomia entre os sexos/gêneros, que exclui, delimita, violenta, educa as performances. Aliás uma falsa-dicotomia maniqueísta e (cis)sexista, pois como diz uma amiga virtual minha, a Jana Jones:" viado e trans tb são homens, assim como meninos afeminados que são fortemente esculhambados pela lógica machista, portanto dividir a opressão machista no esqueminha: homens oprimem x mulheres são oprimidas é coisa de quem não enxerga a complexidade de nossas relações sociais;"

Eu vou ainda mais além: Ambos os aplicativos são sexistas e absolutamente idênticos na invisibilização e assexualização dos grupos não-assinalados, os "anormais". Para grande parte das pessoas, a opressão não virá das notas e das hashtags "machistas", mas sim, da inexistência delas, problema aliás que não vi nenhuma feminista comentar. Alias, o cancelamento de um dos aplicativos nada mais é do que a velha estratégia de (cis)feministas de jogar pra debaixo do tapete, censurar qualquer debate mais aprofundado que lhes permita rever seus conceitos sobre as relações de gênero. Ou pior, o medo de ter sua identidade/papel, seu espacinho privilegiado na sociedade patriarcal contestado, desconstruido. Me parece mais uma estratégia de manutenção do discurso dicotõmico de gêneros e manutenção do status-quo heteronormativo do que defesa dos direitos das mulheres. Estão jogando fora mais uma vez uma oportunidade preciosa de avanço real nas consciências.

Ai está o auge da perversidade dessas brincadeiras: mais uma vez os espíritos mais contestadores é que foram realmente silenciados, violentados, alvejados no tiroteio maluco dos "normais".

Por isso tudo acho de uma suprema covardia esta campanha para retirar do ar ambos os aplicativos. Homens e mulheres cis*, assinalados e padronizados sempre brincaram de Lulu e Tubby, pois como disseram muito bem algumas colegas feministas, é próprio de quem está em posição de privilégio falar sobre a sexualidade do outro. Quem nunca pode participar fomos nós, os "outsiders". Queremos ter pela primeira vez a oportunidade de dar nota pra vocês, caros homens e mulheres normatizados que estão no topo da pirâmide. Não fujam. Não "arreguem". Saibam jogar. Não estraguem a nossa brincadeira. Ou pelo menos admitam que com a avanço da Internet e das tecnologias da informação a forma de pensar gênero, sexualidade, privilégios e privacidade mudaram. As regras são outras, os jogadores são outros..
"Pimenta no cu dos outros é refresco"
No closet

Desbundai e putiái!

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